por que era ela por que era eu



Se encontraram em celebração de amigos. Havia conquistado a inteireza aquela noite, sem esconder-se de nada que a pudesse morder do passado. Integrada de suas partes, respirou vinho e confiou seus sonhos espalhando-os pela varanda com velas ao chão. 
Fez de dançar e encantar como de costume. Com a certeza das sacerdotisas de um passado,  embalou-se pela noite com a melhor saudade. 

Ela conhecia poemas que ele não lia nem nunca havia encarnado seus.
Suas palavras eram belas, mas ele sofria da surdez que grandes egos fazem ao saber dos olhos. Palavras verdadeiras saíam daquela boca que celebrava em dança o esparramar da sua prática. Lindo de ver palavra e prática dançando íntimas.

Pelo chão, seus pés abertos abraçavam a liberdade. O peito presente cantava poesia, cantigas de mar que ali não cabia.
Fez a dança que o corpo lhe dizia, de apresentar o sagrado que ele não merecia.
Sem lhe dar a mão, saíram agarrados confessando amor eterno de uma ilusão.
Apaixonados na solitude do vagão, amaram, arriscando brincadeiras de gargalhar baixinho sem nenhuma opressão.
Caminharam por confissões onde a alma ouvia a Suíte para Cello de Bach ao vento de um campo aberto de concreto.
Fizeram amor dentro de uma barraca improvisada no teto da casa compartilhada. Suspensão de tempo e espaço onde acordaram de volta do passado.
Rapidamente, em tempo atualizado, o encontro vestiu um belo vestido. Caminhou para o dia do desprendimento. 
Não se via naqueles olhos perturbados. Sorriu sem razão e então percebeu que em todas as canções que ouvira com ele, as palavras e sentidos que lhe agradavam, ali nunca se encontraram.
Voltou pelo caminho oposto e seguiu com uma pedra vermelha lapidada em sua mão. Foi quando encontrou-se.
Jogou a pedra ao primeiro rio que a viu.




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